Brasil tem a maior diversidade de árvores do mundo e também o maior número de espécies ameaçadas
Por Sofia Moutinho
Uma árvore frutífera de longas folhas verdes, cujos ramos se assemelham à cauda de uma ave. Não se pode dizer muito mais da Pouteria stenophylla, nativa da Mata Atlântica brasileira: ela está extinta devido à perda de hábitat pelo menos desde 1998, de acordo com a lista de espécies sob ameaça da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). Da planta, que um dia cresceu em nossa terra, na Serra do Órgãos no Rio de Janeiro, só restam algumas folhas ressequidas e desbotadas, guardadas no exílio, em coleções botânicas estrangeiras.
Assim como a Pouteria stenophylla, que nem nome popular em português chegou a ter, outras seis espécies outrora encontradas no Brasil já estão extintas. E muitas outras vão pelo mesmo caminho, segundo um levantamento global apresentado no fim de junho no Fórum Mundial de Biodiversidade, na Suíça.
De acordo com o estudo, coordenado pela Associação Internacional de Jardins Botânicos para Conservação (BGCI, na sigla em inglês), um terço das 60 mil espécies de árvores do planeta correm perigo, a maioria das quais está na região de florestas tropicais da América Central e do Sul. E o Brasil, que encabeça a lista de países com mais variedade, com 8.847 espécies, também é o primeiro no pódio daqueles que têm mais espécies em perigo. Duas em cada dez (1.788) estão em risco, principalmente pelo desmatamento para agricultura, a exploração de madeira e os incêndios florestais. Para completar, quase metade dessas espécies é endêmica, ou seja, só é encontrada aqui.
Entre as espécies ameaçadas estão o araçá-verde (Psidium araucanum), uma árvore frutífera da Mata Atlântica em risco devido à degradação ambiental; o pau-amarelo da Amazônia (Euxylophora paraensis), superexplorado por sua madeira; e o faveiro-de wilson (Dimorphandra wilsonii), exclusivo da região de transição do Cerrado para a Mata Atlântica, e em perigo pelo avanço da agricultura.
As árvores fornecem muitos “serviços ecossistêmicos”, explica a botânica Malin Rivers, que coordenou o levantamento, baseado em literatura e bancos de dados coletados por mais de 500 pesquisadores internacionais. “Além de promover bem-estar para os humanos, as árvores absorvem carbono, previnem a erosão do solo e inundações, e regulam a temperatura e a qualidade do ar,” diz Rivers. Além disso, elas são lar e alimento de diversos animais. Quando uma espécie é extinta, toda a biodiversidade do ecossistema é prejudicada.
No entanto, árvores ameaçadas não têm sido o foco de iniciativas de preservação e reflorestamento mundo afora, conforme dados mais recentes apresentados na Suíça. Globalmente, 85% das espécies não ameaçadas estão em áreas de conservação – parques e reservas nacionais –, em comparação com apenas 56% das espécies em risco de desaparecer.
O mesmo vale para coleções científicas, como jardins botânicos e bancos de sementes, que salvaguardam apenas 21% das espécies sob ameaça contra 45% das que estão em segurança. No Brasil, apenas 73 árvores ameaçadas – 5% das espécies em risco – estão protegidas em bancos de sementes e jardins botânicos, revelam os novos dados do relatório. Coleções estrangeiras abrigam 109 espécies brasileiras periclitantes – mais do que temos por aqui.
Pesquisadores temem que a falta de árvores sob ameaça nas coleções possa prejudicar programas de restauração e conservação para preservar espécies à beira da extinção. “É uma pena,” diz Rivers. “As espécies em perigo em coleções são como uma apólice de seguro. Precisamos delas para estabelecer protocolos de propagação, por sementes ou mudas, para escalar os programas de plantio de árvores.”
Em vez de usar árvores nativas e ameaçadas, muitas iniciativas de reflorestamento e plantio adotam a lógica de “qualquer árvore ao menor custo,” explica Galena Woodhouse, especialista em governança florestal do BGCI. Mas essa abordagem traz impactos negativos para a flora e a fauna locais. “Temos visto um aumento de iniciativas bem-intencionadas de plantio para redução do aquecimento global,” ela observa. “Mas ao plantar árvores não nativas, prejudicamos a biodiversidade, aceleramos a extinção de espécies e, em alguns casos, até aumentamos as emissões de carbono.”
Leia o texto completo no blog Ciência Fundamental, na Folha de S.Paulo
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