14/12/2021 02:56

O que o intestino nos ensina sobre tolerância

  • Blog Ciência Fundamental

Como o sistema imune sabe que não deve combater o feijão do almoço?

Ilustração: Joana Lavôr

Por Clarice Cudischevitch

A função do sistema imune é combater patógenos que vêm de fora, certo? Não exatamente. A maior parte dos micróbios que chegam ao nosso organismo não é nociva. Para o imunologista Daniel Mucida, é mais ou menos como a política migratória do ex-presidente Donald Trump nos EUA: ela parte do princípio de que imigrantes são como patógenos que devem ser combatidos quando, na verdade, eles fazem mais bem do que mal ao país. “Devemos desenvolver tolerância em vez de muros”, diz.

No caso do nosso corpo, a porta de entrada desses imigrantes bem-vindos é o intestino. Em seu sistema imune, a maioria das interações não acontece com patógenos, mas com microrganismos e moléculas provenientes da alimentação. São trilhões (trilhões mesmo, não é figura de linguagem) de bactérias inofensivas que formam a chamada microbiota.

Mas como o corpo é capaz de identificar quais organismos podem nos causar mal e quais devemos tolerar e assimilar? Em outras palavras, como seu corpo sabe que deve combater uma bactéria nociva e deixar em paz o feijão que você come no almoço? Entender como acontece esse equilíbrio da resposta imune é o objetivo de Mucida, professor e chefe do Laboratório de Imunologia da Mucosa na Universidade Rockefeller, nos EUA.

Com uma área de cerca de 300 metros quadrados, a mucosa intestinal humana é a maior superfície corporal exposta ao mundo exterior – do qual se separa apenas por uma fina e permeável camada epitelial. Assim, não surpreende que no intestino haja mais linfócitos, as células de defesa, do que no resto do corpo. É ali que está o nosso sistema imune mais complexo e desenvolvido, com mais anticorpos do que no sangue. E, mesmo com essa alta atividade imunológica, além de lutar contra patógenos, o órgão dá um jeito de exercitar a assimilação. Então, como de fato opera a imunologia do organismo?

“Para entender o sistema imune, temos que entender o que está em torno dele”, diz Mucida. É aqui que entram em cena os famosos conceitos da imunologia de self e não self (que aqui nada têm a ver com a psicologia), muito estudados pelo imunologista português António Coutinho: as diferenças entre moléculas que são próprias do corpo e aquelas que vêm de fora.

O que o grupo de Mucida já demonstrou é que o próprio ambiente intestinal facilita esse equilíbrio entre tolerância e muros ao compartimentalizar a resposta. O sistema imune prepara algumas células imunológicas para aceitar os nutrientes da dieta encontrados no intestino delgado, enquanto prepara outras para lidar com organismos que estão no intestino grosso. A natureza dos sinais oriundos das diferentes partes do intestino e os mecanismos pelos quais eles influenciam a adaptação das células imunes, no entanto, ainda não são bem compreendidos. “Como o intestino vê uma proteína ingerida na dieta de forma diferente da proteína de uma vacina que vai gerar resposta imune?”, se pergunta o cientista.

Leia o texto completo no blog Ciência Fundamental, na Folha de S.Paulo. 

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