Clarice Cudischevitch
Por que há pessoas que desenvolvem dependência ao álcool e outras não? Os indivíduos são afetados pelo consumo de bebidas alcoólicas de formas bastante distintas. Para estudar essas diferenças, a bióloga da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Ana Carolina Luchiari, apoiada pelo Instituto Serrapilheira, usa um modelo animal pouco comum: o zebrafish.
Este é um peixe de água doce de cerca de 5 centímetros de comprimento, que começou a ser empregado em pesquisas na década de 70 do século passado. Os ratos ainda são os modelos preferidos pelos cientistas, mas, nos últimos dez anos, cresceu o uso do peixe em pesquisas.
Atualmente, 800 laboratórios em todo o mundo utilizam cerca de 8 milhões de zebrafish por ano em experimentos. No de Luchiari, ela observa a diferença comportamental dos peixes diante do consumo do álcool para compreender o mecanismo de dependência e, assim, buscar medicamentos mais eficientes.
“As vantagens do zebrafish são diversas”, ressalta a bióloga. São baratos, abundantes, ocupam menos espaço que os ratos e têm um desenvolvimento mais rápido – o ovo eclode em três dias, o animal está livre do saco vitelínico em cinco, torna-se adulto em três meses e procria em seis, gerando de 400 a 500 ovos por desova.
Em sua versão selvagem, o zebrafish tem cerca de 70% de semelhança genética com os humanos, mas os cientistas vêm desenvolvendo novas linhagens que chegam a 85% de similaridade, a mesma encontrada em ratos.
Efeitos do álcool diante de comportamentos distintos
Para pesquisar os efeitos do álcool, Luchiari prefere empregar o zebrafish selvagem. Ela explica que, no estudo, a variabilidade é essencial. “Eu analiso as características individuais, então preciso que haja essas diferenças, já que as pessoas também são distintas entre si.”
O que a bióloga faz é observar o comportamento dos peixes em relação ao consumo do álcool. Para isso, divide-os em dois grupos: os que se arriscam mais e os mais conservadores. Depois, expõe ambos os grupos à bebida.
Ela observou que os peixes de perfil mais conservador e tímido, quando recebem uma dose moderada de álcool (equivalente a uma taça de vinho), tornam-se mais exploradores, perdendo o medo de ambientes novos e arriscando-se mais.
Os peixes de perfil mais desbravador, que já se arriscam normalmente, não mudam em nada o comportamento quando expostos à mesma dose. A constatação surpreendeu Luchiari, que esperava que os peixes que tendem a se arriscar estivessem mais suscetíveis ao álcool do que os mais reservados.
Ela observou, ainda, que, se a dose é aumentada, o comportamento dos dois grupos muda. Os peixes que já costumam se arriscar ficam mais próximos dos seus companheiros, buscando agrupamento e proteção, e os que eram originalmente reservados ficam ainda menos conservadores. Os primeiros resultados foram publicados na revista Plos One, em junho. Agora, a bióloga busca entender o que acontece no cérebro dos peixes para essa diferença de respostas.
“O que já sabemos é que indivíduos que se arriscam mais têm mais dopamina, o neurotransmissor relacionado à sensação de prazer. Isso faz com que o animal enfrente situações com mais facilidade”, afirma. Os animais mais tímidos têm mais serotonina, o neurotransmissor relacionado à sensação de bem estar.
As duas substâncias atuam em regiões diferentes do cérebro, e o álcool afeta seus níveis – por exemplo, aumentando a secreção de dopamina. “Quando o indivíduo bebe, os níveis de dopamina se elevam principalmente na região cerebral relacionada à recompensa, então a pessoa acaba se viciando na sensação de prazer oferecida pela ingestão do álcool, e passa a buscar no álcool mais e mais prazer, o que caracteriza o vício.”
O palpite de Luchiari é que os peixes que já têm o nível de dopamina alto acabam não sofrendo tanto a influência do álcool. Já nos mais tímidos, o álcool acaba acentuando a liberação da substância.
A ideia da cientista é, no futuro, testar nos peixes os remédios contra dependência disponíveis no mercado, que não são eficientes – a reincidência chega a 90%. Paralelamente, Luchiari testará o efeito do chá de ayahuasca, bebida feita a partir de um cipó amazônico, que vem apresentando resultados contra a depressão e ansiedade.
Muitos outros estudos vêm sendo desenvolvidos com o uso do zebrafish, em temas como sono, estresse, ansiedade, doença de Alzheimer e toxicologia. Por causa dessa repercussão, há cinco anos, o simpósio “Zebrafish como modelo animal de pesquisa” passou a ser realizado no Brasil, reunindo os principais pesquisadores com o objetivo de propor novas perspectivas para a área.
*Matéria atualizada no dia 8 de março de 2021
Os serviços deste site podem conter links para outros sites ou serviços on-line que são operados e mantidos por terceiros e que não estão sob controle ou são mantidos pelo Instituto Serrapilheira.
Os artigos deste site podem incluir conteúdo incorporado de outros sites.
O site armazena as informações pessoais que os usuários registram em nosso site as quais só podem ser acessadas e editadas pelos administradores do site.
O usuário pode solicitar que apaguemos todos os dados pessoais que mantemos sobre ele. Isso não inclui nenhum dado que somos obrigados a manter para fins administrativos, legais ou de segurança.
Nenhum dado sobre os visitantes que se inscrevem no site é negociado pelo Instituto Serrapilheira, sob nenhuma circunstância.
O Instituto Serrapilheira pode decidir alterar a sua política de uso de dados a qualquer momento e por sua exclusiva deliberação.
Cookie | Duração | Descrição |
---|---|---|
cookielawinfo-checkbox-analytics | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Analytics". |
cookielawinfo-checkbox-functional | 11 months | The cookie is set by GDPR cookie consent to record the user consent for the cookies in the category "Functional". |
cookielawinfo-checkbox-necessary | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookies is used to store the user consent for the cookies in the category "Necessary". |
cookielawinfo-checkbox-others | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Other. |
cookielawinfo-checkbox-performance | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Performance". |
viewed_cookie_policy | 11 months | The cookie is set by the GDPR Cookie Consent plugin and is used to store whether or not user has consented to the use of cookies. It does not store any personal data. |