Como combater a desinformação sem censurar o debate científico?
Por Olavo Amaral
Conta a fábula que um jovem pastor que se sentia sozinho no campo resolveu gritar “lobo” para chamar a atenção da aldeia e ganhar companhia. Os camponeses atenderam nas primeiras vezes, mas logo se cansaram da pegadinha e pararam de sair correndo. No dia em que o lobo apareceu de verdade, os gritos soaram em vão e as ovelhas – bem como o pastor, em algumas versões – acabaram devoradas.
Em dezembro de 2021, os editores do British Medical Journal, uma das revistas médicas mais tradicionais do mundo, publicaram uma carta aberta a Mark Zuckerberg. Na carta, os editores avisam que a checagem de fatos do Facebook marca como “descontextualizados” os compartilhamentos de uma notícia publicada pela revista, sobre irregularidades em um ensaio clínico da vacina da Pfizer nos EUA. A empresa fincou pé em manter o alerta, alegando que o artigo vinha sendo compartilhado junto a informações falsas, que os problemas afetavam apenas três dos 153 centros do estudo e que a acusação partira de uma fonte que interagia com militantes antivacinas no Twitter.
Mesmo quem não acompanha o debate sobre vacinação já deve ter recebido alguma notícia alarmante no grupo de WhatsApp da família ou do condomínio. Vacinas contra a Covid-19 vão nos transformar em organismos geneticamente modificados e permitir o patenteamento de seres humanos. Ou talvez inserir microchips que nos tornarão controláveis por antenas 5G. Ou simplesmente causar uma epidemia de hospitalizações que acarretará mais danos do que a doença em si.
Nenhuma dessas informações é verdadeira, o que vem provocando uma pressão crescente para que plataformas de mídias sociais sejam mais proativas em remover desinformação. Mas com bilhões de postagens compartilhadas no Facebook e quase um milhão de horas de vídeo postadas no Youtube diariamente, checar conteúdo se torna uma tarefa que vai muito além da capacidade de um ser humano – ou mesmo de um exército deles.
Não surpreendentemente, boa parte do trabalho tem sido delegado a algoritmos – não só no quesito vacinas mas em inúmeras questões relacionadas à Covid-19. A lista de políticas do Youtube elenca dezenas de categorias de conteúdo não permitido pela plataforma, que vão de alegações sobre riscos de vacinas ou máscaras até afirmações de que medicações como hidroxicloroquina e ivermectina são efetivas ou seguras no tratamento da doença.
As políticas têm sido aplicadas pelas plataformas – e vêm removendo não só malucos aleatórios como perfis com credenciais científicas. O Twitter recentemente suspendeu a conta do imunologista americano Robert Malone, que se intitula inventor das vacinas de mRNA (um título algo exagerado, ainda que Malone tenha contribuições importantes para o tema), após ele ter alegado que a vacina da Pfizer causava mais doença do que prevenia. Não foi a primeira declaração polêmica de Malone, que há meses vem ganhando popularidade com o movimento antivacinas.
Leia o texto completo no blog Ciência Fundamental, na Folha de S.Paulo.
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