03/06/2020 02:53

Estudo de grupo brasileiro ganha capa na maior revista de física do mundo

  • Física

Grupo do pesquisador Rafael Chaves estudou, pela primeira vez, a futura internet quântica a partir da perspectiva da ciência de redes complexas

Imagem de capa da revista Physical Review Letters

Pedro Lira

Nomes brasileiros ganharam destaque na última semana após estamparem o artigo de capa da Physical Review Letters. A publicação de física, uma das mais reconhecidas do meio, trouxe o estudo dos pesquisadores em duas áreas de pesquisa bastante atuais:  internet quântica e a ciência de redes complexas.

O grupo, liderado pelo físico Rafael Chaves, grantee da primeira chamada do Serrapilheira e pesquisador do Instituto Internacional de Física da UFRN, foi o primeiro a  tentar entender a futura internet quântica da perspectiva da ciência de redes complexas. Algo que, segundo o cientista, pode ser o passo inicial para muitos estudos futuros sobre comunicação quântica em redes de larga escala.

“Ser capa na que talvez seja a mais antiga e prestigiosa revista de física do mundo mostra a qualidade da física no Brasil, seja em pesquisa ou na formação de novos talentos”, comenta Chaves em nome do grupo, formado por quatro pesquisadores. “Em um momento tão difícil para a ciência e as universidades públicas no Brasil, vejo essa capa como um manifesto, até mesmo um ato de resistência.”

A autora principal do artigo, Samuraí Brito, faz parte da equipe de Rafael há mais de três anos. De descendência indígena, ela será, a partir de setembro, paga parcialmente com o bônus de diversidade oferecido pelo Serrapilheira (valor opcional destinado à integração e formação de pessoas de grupos sub-representados na ciência). “Esse bônus veio na melhor hora possível, já que permitirá a Samuraí continuar focando em sua pesquisa por pelo menos mais três anos”, comenta Rafael, que no passado incentivou a cientista a não desistir da posição de pesquisadora para assumir um cargo de professora de 2° grau na rede estadual. 

Rafael Chaves

O estudo

Apesar de todos os avanços recentes, a internet quântica ainda não existe em escala global. O que o grupo fez foi propor um modelo para esta futura internet quântica baseado na ideia de que os canais quânticos de comunicação serão mediados pelas fibras óticas já existentes no mundo. “Uma característica importante que descobrimos é que essa rede dá origem à uma transição de fase, tal como a transição de fase da água de líquida para gasosa”, explica Rafael. Quando a densidade de pontos específicos na rede quântica é grande o suficiente, todos os pontos desta rede se conectam subitamente. “Essa é uma propriedade importante pois nos mostra quão grandes ou densas as futuras redes quânticas devem ser para se tornarem operacionais.”

Segundo o físico, podemos pensar na internet como um sistema de comunicação com dispositivos interconectados em redes por meio de canais de comunicação, como fibras óticas, ondas de rádio etc. Na internet atual, esses canais são clássicos, ou seja, somente comunicação clássica na forma de bits 0 e 1 podem ser transmitidos.

“Com os avanços em tecnologias quânticas nas últimas décadas já é possível imaginar uma versão quântica desta rede”, explica. “Nela, os canais de comunicação permitem o envio de informação em bits quânticos que estão numa superposição de zeros e uns ou o compartilhamento de partículas emaranhadas que tem uma correlação tão forte entre si que se comportam como um ente físico único, mesmo a grandes distâncias.”

Chaves acrescenta que as aplicações destes canais de comunicação quânticos são variados, permitindo formas mais eficientes de comunicação, como os protocolos de criptografia quântica. “Neste caso a segurança da informação é garantida pelas próprias leis da física; temos a garantia de que um hacker não pode nos espionar sem ser detectado, a não ser que ele contorne as próprias regras da natureza”, conclui. 

Modelo de redes

O grupo utilizou no estudo conceitos de modelagem de rede tais como a distribuição de conectividade e menor caminho e que ganharam muita visibilidade após a descoberta do “modelo de redes livre de escala”, criado pelos cientistas húngaros Albert-László Barabási e Réka Albert. Tais modelos são aplicados em várias situações, desde na segurança de redes de computadores ao estudo de redes celulares e biológicas, e mesmo na otimização de estratégias de negócios e campanhas publicitárias.

“Por detrás de comportamentos tão diversos e complexos, muitas vezes temos regras universais e extremamente simples”, comenta. Este é o tema de seu novo texto no blog Ciência Fundamental, que pode ser lido no site da Folha de S.Paulo

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