30/09/2020 09:36

O cientista das ruas

  • Blog Ciência Fundamental

Do interior do Rio Grande do Sul, Cesar Victora lançou a epidemiologia brasileira no mundo

Ilustração: Lucas Moratelli

Por Clarice Cudischevitch

Quem tem filhos ou pretende ter provavelmente já sabe: o aleitamento materno exclusivo até os seis meses é fundamental para o crescimento saudável dos bebês. A orientação tanto da Organização Mundial da Saúde (OMS) quanto do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) é, hoje, uma política de saúde adotada praticamente no mundo todo, mas nasceu no interior do Brasil, graças a um cientista que tinha o sonho de morar numa cidade pequena.

A cidade é Pelotas, no litoral sul do Rio Grande do Sul, e o cientista é Cesar Victora, um dos maiores nomes da epidemiologia mundial. Não é por acaso que o município, tradicionalmente conhecido pela produção do charque (uma carne salgada e seca ao sol), é o cenário por trás de alguns dos grandes avanços na área. A história de Pelotas se entrelaça com a trajetória do próprio Victora na epidemiologia – uma ciência que “vai às ruas”, na qual a cidade e seus moradores têm, justamente, um papel central.

Quando se fala que a epidemiologia vai às ruas, os exemplos são literais. Há quase 40 anos, Victora acompanha junto ao amigo e pediatra Fernando Barros as chamadas coortes de nascimento — estudos em que se observa a saúde de indivíduos nascidos em determinado ano num determinado lugar por períodos longos. Isso significa que, desde 1982, a cada 11 anos (era para ser dez, mas o financiamento atrasou), eles fazem um censo de todos os nascimentos ocorridos em Pelotas indo de porta em porta nos hospitais da cidade. São de 5 a 6 mil crianças por ano.

O acompanhamento continua até hoje, com bons retornos. Quando a primeira coorte, a de 1982, completou 30 anos, eles localizaram 68% dos nascidos naquele ano. Inclusive, uma das observações que mais chamou atenção é a de que mais da metade das pessoas está com sobrepeso e obesidade (antes estavam subnutridas).

Quem também vai às ruas de Pelotas é o Epicovid19, o maior estudo epidemiológico do mundo sobre coronavírus. O levantamento, que investiga o número real de infectados pelo SARS-CoV-2, é coordenado por Victora e pelo reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal (que escreveu sobre a experiência aqui no blog).

Aliás, se a pandemia de Covid-19 teve um lado bom para Victora, ele se deu na sua área. “A população aprendeu a falar ‘epidemiologia’. O avanço da pesquisa foi vertiginoso nesse período, mas estamos vendo um sucateamento da ciência brasileira e na próxima talvez a gente não consiga uma resposta tão ágil, a não ser que os investimentos sejam retomados.”

Leia o texto completo no blog Ciência Fundamental na Folha de S.Paulo

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